domingo, maio 08, 2016

Carta aberta à minha mãe - 1

Mãe, hoje é o seu dia.

Todos já sabemos disso, até porque o segundo domingo de maio nunca foi um dia qualquer para nós. Primeiramente porque a loja sempre vendeu muito e, nos seus últimos anos de vida as semanas que antecediam esta data sempre eram estafantes para você. Dias que trouxeram benefícios, mas também fizeram com que a sua vaidade fosse acabando, levando embora suas unhas, seu cabelo e a sua vontade de ficar bonita! Creio que as mães são assim... se esquecem um pouco delas por causa da gente!

Sobre as ausências, já sabemos falar de todas de cor e salteado, se tornando verdadeiros clichês. Por isso eu hoje tive muita vontade em falar das presenças. Para aliviar a dor, que não se prontifica a ficar mais fraca, eu estou fazendo o exercício de imaginar como seria se você estivesse aqui, depois desses... 18 anos? É isso?

Uma criança, se nascesse em 1998, hoje estaria virando um adulto. Quanta responsabilidade eu tenho, minha mãe! Mas parece, que mesmo na maioridade o nosso Brasil está desaprendendo a viver! A senhora não acreditaria  nas coisas que estamos passando... Não vou me ater a falar de política, mas é inevitável te contar que tem gente que acredita (ou quer vender a ideia) de que a ditadura não aconteceu. Pior... estão querendo que ela volte como uma resposta às besteiras que andaram fazendo com o nosso país! A senhora se indignaria dos filhos da pátria que tanto se empenhou em educar! A cada ligada na televisão, todas aquelas palavras que você sabia dizer, realmente seriam ditas! Sim, as dizemos... até aquelas que a senhora não gostava! Tá f...

Porém, uma coisa ficou melhor para a gente... não se pode mais fumar em locais fechados ou cobertos. A senhora com certeza xingaria, mas pouco a pouco iria se acostumar. Eu teria até a esperança que você diminuísse a quantidade de Minister diários. Que aliás, cá entre nós, como aumentou o cigarro! Desde quando você se foi o povo fumador está diminuindo a fumaça porque o dinheiro curto não se pode mais queimar.

Estou escrevendo de um computador direto da Espanha. É, mãe, eu consegui! Não foi para a Itália como você queria, mas fui acolhida aqui por um professor jóia, que ironicamente se chama Jesús... mas é ateu! Bem, não é necessário ter crenças para que as pessoas sejam boas umas com as outras, né!? Apesar de sermos católicas, somos muito compreensivas com o outro e respeitamos as diferenças, assim como foi mostrado, muito mais do que falado, dentro da nossa casa! Jesús é ótimo comigo, compreensivo e um cara muito simples, apesar do seu alto grau de conhecimento! Estou aprendendo demais com a sua generosidade, proveniente dos verdadeiros professores, assim como você foi!

Como é difícil viver fora do nosso país! É tudo muito diferente mas o que prevalece aqui é o afeto, apesar das diferenças culturais. Estou procurando me manter equilibrada, apesar da saudade de tudo. Mas saudade é uma coisa que estamos bem acostumadas a lidar, né!? Não se preocupe! Porém, se não fosse pelo pai e pela Dany, eu certamente não estaria aqui. Está tudo sob controle apesar do esforço estar custando 4,5 vezes mais. É, o Euro aumentou demais, assim como o dólar! Não queria te dizer, mas aquela inflação voltou, porém está mascarada. Está aumentando tudo... nosso país está voltando a ficar desacreditado, mas eu não desisto!

Uma coisa da qual eu me orgulho bastante é do legado que você deixou para mim. Sou professora como você e amo demais isso! Você com certeza se afeiçoaria dos Dantons, Otávios, Carlas, Matheus, Elvis, Betinhos, Danieis... meus filhos adotivos... que não valem nada, assim como a mãe emprestada deles! Que pessoas viraram esses meninos... que grandes homens e mulheres eles se tornaram... Uma legião deles estava na minha despedida quando eu vim pra Espanha... se amontoando comigo, igualzinho como você fazia com os meus amigos e com os seus alunos mais queridos!

Mãe, você não acredita... não tenho filhos, nem a Dany. Mas a senhora se orgulharia demais do caminho que a gente tomou! A sua filha mais velha brinca de Tupã... quanta criança ela já livrou das enfermidades brancas... quanta vida ela já salvou! Que médica ela se tornou! Ela é uma pessoa tão amada... orgulho da família! Só estamos em busca de um namorado bacana pra ela, porque os homens de hoje... só xingando! Mas pode deixar que disso eu estou cuidando pessoalmente!

O pai está ótimo! Descobrimos uma diabetes há pouco tempo, mas que saúde esse homem tem! Meu Deus! Caminha todos os dias e é uma pessoa digna de se espelhar! Hoje ele "fala mais do que pobre na chuva", é admirado por muita gente, além de ser uma das figuras folclóricas de Barra Mansa! Figuraça! A Dany está de olho nessas coisas da saúde, mas acho que é o que menos devemos nos preocupar!

Suas amigas sempre falam de você! É só engraçado que muitas delas me param na rua e choram a sua ausência! Que pessoa querida você era! Sou muito orgulhosa por ser sua filha! Você é sempre lembrada pela nossa família como uma pessoa espirituosa, divertida e autêntica! Mas na moral, acho que estou me saindo à você! Dá um pouco de medo quando me olho no espelho... como estamos parecidas... Não levo desaforo para casa, mas estou aprendendo a equilibrar esse gênio... é melhor para todos!

Bem, vou terminando por aqui porque há muito a fazer no dia de hoje! Sevilha só chove, mas estou muito bem instalada graças a Deus!

Obrigada por tudo, por isso tudo e pelo aprendizado na sua ausência! Nós estamos tentando conviver com esse vácuo ainda, que ninguém está preparado, mas que sirva de lição a todos que a presença ou a ausência traz o benefício da existência da mãe, aquela que não se pode negar... uma junção cósmica na qual regula as nossas atitudes. Porque da mãe ninguém esconde nada!

Te amo!