segunda-feira, setembro 23, 2002

Prá ser chato, tem que ter talento
Acabei de chegar da minha terra-natal, no interior do Rio de Janeiro, depois de enfrentar quase 3 horas de ônibus apertado debaixo de chuva. Já mal-humorada em ter acordado as 6 da matina para enfrentar o bendito cata-corno, chego na rodoviária, vou até o guichê e peço para a "simpática" vendedora de bilhetes poltrona 1, ou 2, ou 3, ou 4 (gosto de viajar pilotando junto ao motorista). A lindíssima, com toda educação do mundo, responde através daquele auto-falantezinho de merda: "só tem a 18".. - A dezoito é aquela apertada, que nem janela é!

Chegando perto do ônibus, avisto uma figura (já posicionada em seu local) de barba grande, com a "fuça" para o lado de fora fumando e com cara de bêbado imundo (mendigo). Aí pensei: "pqp, esse desgraçado vai encher o saco e não me deixar dormir!"... Preconceito, é claro, pois eu é quem deveria estar com cara de rôla-bêba! Bom, a "marinete já encontrava-se, dentro de suas condições, lotada. Sendo que todo mundo que viaja pra esses lados, sabe que o lado esquerdo é de quem viaja partindo da minha cidade, e o lado direito, da cidade vizinha, onde o ônibus ainda ia parar. Não preciso nem dizer que o cara-de-bêbado estava do lado direito. As primeira 8 poltronas do lado esquerdo estavam vazias e, enquanto o ônibus não fazia a sua parada habitual na cidade vizinha, posicionei-me na primeira cadeira, afim de evitar a número 18.

Chegando na parada, senti o número de pessoas esperando a "princesinha do Agreste" chegar e resolvi recolher-me à minha insignificância e sentar na apertada poltrona de número 18. O ônibus não foi enchendo, foi inchando. Fazendo de desentendida, sentei na 17 (pô, 17 é janela). Relaxei, coloquei a minha bolsa grande no bagageiro de cima e a bolsinha de mão embaixo da bunda, fechei o casaco até o nariz (tá frio pacas) e ensaiei o dormidão. Já quase pegando no sono, sinto um dedo no meu ombro me cutucando. Abri um dos olhos e ali estava a figura do meu lado dizendo: "a minha é a dezessete, mas pode ficar aí!" - Balancei a cabeça em um sinal de positivo e peguei no sono. Já quase dormindo, sinto de novo o mesmo dedo no ombro. Com o sorrisão amarelo, abri dessa vez o outro olho já ouvindo da "pessoa": "Posso fechar a... a janela... quero dizer, a cortina? Claridade..." - Sem o meu consentimento, já foi logo fechando o fétido pano marrom. Só um adendo ao relato, ODEIO A CORTINA FECHADA!

Com uma rápida e irritada fechada de olhos, começa a desputa pelo braço divisor das poltronas. O indivíduo se meche na cadeira, empurra o meu braço e, eu já acordada, resolvi comprar a briga e empurrei o braço dele também. Isso tudo acontecendo e eu fingindo que estava dormindo, quando já se aproximava a segunda parada: em Piraí. Comecei a pensar: "Pô, e agora pra pedir pra esse puto pra eu descer pra comer pastel?" - Se aproximando a cidade, pelo menos essa boa vontade o cara com bafão de mata-rato teve: "zuniu" antes que eu precisasse pedir.

Desci do ônibus e, junto comigo, avistei um pastelzinho acabando de sair. Comi um de carne e um de queijo e percebi a figura ter dado um sumisso. Depois de comeire e bebeire tudo o que tinha direito, subi no cata-jeca já rezando para haver uma outra poltrona disponível, bem longe do "cara-de-maluco-bêbado". Quando, em câmera-lenta, já escutando a trilha sonora: "como uma deusa, você me mantém...", avisto as duas (2 - II) penúltimas poltronas vazias e me esperando. Sem olhar para trás, fui linda ocupar logo as duas. Recostei-me na 33, coloquei os pés na 34, sentei em cima da bolsa e APAGUEI! Quando sinto novamente um dedo cutucando o meu ombro. Irritada, abri os dois olhos, levantando somente uma das sombrancelhas e escuto, após perceber o ônibus todo vazio: "Moça, a gente chegou!"