Ressaca do Carnaval
Quarta-feira de cinzas, 01 de março de 2006.
Até o ano passado, fazia parte do meu cotidiano na data que se repetia, uma dor no peito juntando-se a dor de cabeça, fazendo juz a toda a cachaça consumida por quatro dias consecutivos.
Era comum na quarta-feira um sentimento de vazio, mas de um vazio físico. Montes e montes de lixo pelas ruas, servindo de obstáculo para montes e montes de pessoas com mochilas e colchonetes nas costas, é óbvio, esvaziando as casas. Pessoas que vieram e serviram de obstáculo para os blocos, bandas e brincadeiras.
É irônico. Mas muitos de vocês, meus leitores, ligavam na quarta-feira para saber se eu havia acreditado em tudo o que me disseram durante o carnaval: nas promessas de casamento, nos encontros para o dia seguinte, no preço barato da camisa do bloco (sou da era pré-abadá) e, principalmente, que o mundo acabaria na quarta-feira de cinzas. Eu sempre acreditei. Pois o carnaval é a minha festa. Eu esperava o carnaval tanto quanto meu aniversário. E, assim como eu acreditava no comparecimento dos meus convidados, bebia tudo antes da quarta-feira de cinzas. Vai que o mundo acaba mesmo... deixa eu beber tudo agora!
Não há como não comparar. Não precisam ficar tristes pelo bloco que esse ano não fui, pelos ensaios da Mangueira que eu perdi e por esse ano eu não ter acreditado em nada. Mas, como eu não gosto de rotinas, decidi fazer da minha quarta-feira de cinzas, uma data sem o Bacalhau do Batata. Hoje acordei sem ressaca.
Eu, que já saí de lama da cabeça aos pés, depois de tanto pisar para misturar todo aquele pó colhido na Praia do Paiva de Chico Science, corri dela... da lama. Torci para dessa vez não dar nem de cara com o Bloco da Lama de Paraty. Dele, só vi os vestígios pelas paredes e carros, dando graças a Deus por não tê-los encontrado. Vai que eu acredito ser mesmo um GUAIAMUM e me jogar naquilo tudo.
Confesso que tremi. Confesso que meu coração foi a mil ouvindo a batucada. A magia ficou por aí, circulando, mas fui forte. O pó de pirlimpimpim não me atingiu. Fiquei quietinha e estou aqui, feliz da vida com essa minha escolha de ficar no meu canto a dois.
Não fui à Olinda. Não fui à Ouro Preto. Nem passei perto das ruas do Rio de Janeiro, e, da Marquês de Sapucaí, a Mangueira eu não vi nem entrando nem saindo. Não ouvi MEU frevo, não vim com nenhum hit do momento e nem tenho foto jogada num barril de cerveja. Não tomei nenhum pau do índio. Não liderei nenhum bloco de todo mundo saindo de verde entitulado de cloroFILA.
Tudo bem, não terei muita coisa pra contar esse ano. Tudo o que tenho, foi tão bom, que vou guardar para mim como a minha própria piada interna. Não vesti nada. A fantasia foi a Kitty quieta e pacata. Sua vez de acreditar. Esperem até o meu aniversário.