Postei há alguns dias no Fafabookson que iria escrever um livro que poderia ser um possível bestseller: "Poliana velha: a arte de ver o lado bom das coisas aos 40 anos". O post causou uma imensa comoção, principalmente entre os meus amigos que já fizeram 40.
Para quem não sabe, Poliana era aquela menina que sofriiiiaaaaa "o pão que o diabo amassou", mas no fundo, toda destruída, sem dente e machucada, ainda se contentava em "ouvir o canto dos pássaros". Percebi que sou muito parecida com aquela garota, pois na infância, em meio ao bullying que sofri, às intempéries da família e, ao crescer, até com a perda da minha mãe, sempre enxerguei o lado bom das coisas!
Minha infância não foi fácil! Ao contrário do que muitos adultos falam, ser criança é uma tarefa muito difícil... alguém se lembra da dureza que foi largar a fralda e começar a usar o pinico? Uma das coisas mais difíceis para mim foi a hora de parar de andar pelada! Já nadei muito depois de velha pelada na piscina da Tia Berê, no rio de Penedo depois do Finlandês e, assim que cheguei na faculdade, no rio dos Pilões depois das boates. É, acho que nesse quesito eu não aprendi a parar de ser criança. E assim sabem todos os meus amigos que frequentam a minha casa. Minha perereca já não é nenhuma novidade!
Outra dificuldade na infância foi o momento de andar como menina. Minhas amigas sempre me amavam, mesmo eu sendo reconhecidamente um sapatão! Eu nem sabia o que era isso, mas me incomodava com os xingamentos, pois aquilo que eu era (um ser indefinido), já ganhou o adjetivo de andrógeno posteriormente e lésbica anos depois. Mas o verdadeiro motivo daquele nome era porque eu gostava de jogar futebol, queria ter um "peru"para mijar na parede igual ao do Cesinha. Não, ele nunca deixou que eu visse o dele, nem mesmo quando ele operou de fimose. Mas o fato de eu andar de macacão, de camisa do Flamengo, não gostar de pentear o cabelo e andar toda ralada de skate e bicicleta sempre incomodou.
Hoje uso Helena Rubinstein (lembram), Claude Bergére e Acqua Fresca do Boticário. Hoje sou uma mulher! Brincadeira... Haja MAC para se disfarçar...
O lado bom se ser sapatão é beijar meninas! Mesmo que isso tenha acontecido depois de velha, ainda fiquei sem saber se era ou não até muito depois de beijar a primeira mulher da minha vida. Eu disse que não era fácil! Não é fácil assumir a homossexualidade publicamente nem nos dias de hoje. Hoje beijo uma boca só, eu juro (para fins de procriação)... Beijo muitas bocas! Meus amigos assim o fazem comigo. Comoção mesmo é quando beijo minha irmã em público... vejo as pessoas se entreolharem e desconfiarem... dela, é claro! Mas é interessante, que minha namorada mesmo não beijo em público, mas todo mundo sabe da gente! Vai entender...
Uma dificuldade na minha infância foi a convivência com meus amigos usando drogas. Eu, como tinha uma mãe muito brava, sempre tive medo de fumar maconha! Mas acompanhei de perto algumas pessoas se afundarem nisso aí (não na maconha, é claro)! Bem, mas confesso que a cachaça entrou na minha vida cedo... afinal de contas, como eu ia ficar perto para ajudar se não fosse um deles? A cerveja foi meu uniforme de camuflagem. E é até hoje. Ela é uma boa arma para me aproximar das pessoas mais difíceis! Esse foi o lado bom... Porém, tive que aprender e lidar com as perdas que tive por causa do álcool: muitos amigos ficaram pelas estradas e não voltaram para casa. É, temos que passar os nossos 40 anos sem eles fazerem seus 40.
E por falar em aprendizado, não tem como não aprender com as perdas. Acredito que essa escola é a mais dura: a escola da morte! Hoje, aos 40, sei o quanto elas são importantes para fazer a gente "aprumar" e relembrar o que realmente é importante! Aprendi com cada perda, tenho certeza. Agora as vejo como renovação, como outro tipo de ganho! Minha mãe se foi, mas deixou eu e minha irmã muito fortes, eu e meu pai grandes amigos, eu e minha avó "chapas"! É, essa última perda aí... bem... ainda vou aprender com ela!
Mas é incrível o legado que a gente deixa em vida! Fazem 17 anos que mamãe morreu, mas não se pode falar dela com suas amigas, que elas ainda choram... até que é divertido ver as velhas me pararem na rua e relembrando alguma peripécia da minha mãe: da coca-cola que ela bebia em litros, dos cigarros que ela fumava e até dela andando de pijama na rua! As coisas dela são relembradas até pelos meus amigos:
- Kitty, sua mãe matava a gente de vergonha indo buscar a gente na escola de chinelo de dormir! - dizia Juju em uma conversa.
- Nossa, Tia Uyara apertava tanto a minha bochecha!
Ela já quiz me casar com o Cesinha, com o Marcus e até com o Amaral! Eu já fui apaixonada por todos eles, confesso! E ela dizia: "Cristiana não vai casar nunca, porque fica logo amiga desses meninos". Ficando amiga, eu já virava cupido de novos casais... nem queria beijar não, era admiração de "parça"! Engraçado... mamãe nunca quiz que eu me casasse com o Juninho, com o Edson, com o Agnaldo e, muito menos com o Benê! Só de birra, mãe, hoje vou me casar com a Ariane. Falta só ela pedir direito e marcar de fato!
Minha casa já foi palco de muito chororô por término de namoro, divã das lamentações, muro de proteção, camarim das fantasias e blocos de carnaval... Ah, Xumbreca levou um vestido vermelho e nunca mais entregou! Mas nossa casa também já foi palco para representação e ringue de luta! Quando era para dar bronca, minha mãe não tinha para ninguém... afinal de contas, ela era professora de metade dos meus amigos e eles tinham muito medo dela, mas com profunda admiração!
Quando minha mãe tinha 40 anos, eu tinha 12. Imagine agora seu eu tivesse uma filha de 12? Minhas amigas até já têm filhos de 12 e que passaram dos 12. Mas acreditem, esses filhos não foram metade do que nós fomos! Essa era uma célebre frase de Dona Uyara na minha adolescência: "ela não é metade do que eu era!" Tudo bem, ela também não sabia de metade do que eu fazia... levemos isso em consideração.
Aos 12 anos sonhávamos com muitas coisas... eu não sonhava em ser professora, mas foi nessa idade que conheci o meu mano Márcio. E foi por causa dele que eu sonhava com o mar, em pegar onda! Era com ele que eu escutava punk e falava de skate. Foi nesse tempo que eu comecei a andar com uma rapaziada da pesada... e por causa dele, hoje sou designer! Agora que me dei conta que ele foi o primeiro a fazer 40! Ah, aos 12 tomei meu primeiro porre e comecei a dirigir... acreditem... tudo devidamente escondidinho da minha mãe! Eu disse!
Já que falamos na ordem das coisas, eu ainda não fiz 40! Tudo começou com o "homem mais velho do mundo", o titio Marcus. Percebi hoje que o último post foi no dia do aniversário dele! Na verdade, teve a Érica e a Flávia antes, mas eu sempre gostei de ligar no 23 de Dezembro e dizer: "Tá ficando velho, héim, amigo!?" O mais velho de nós (em comportamento) também é o mais rico... dizem que faz tempo que não sorri! Já foi quase a galera toda... e os meus 40... nem te conto!
Nos meus 30 anos decidi comemorar em uma borracharia ou em uma oficina mecânica. Decorei um espaço com uma carreta de sucata, devidamente patrocinada pela Metalúrgica Vulcano, ao som de Alex e Dj Fabiano. A festa teve o título: "A Kitty este ano é a garota do calendário: aos 30 Km rodados é a hora de parar para dar uma geral". Chamei todos os meus amigos verdadeiros (que eram mais de 100) e ali recebi o povo de Lorena, de Barra Mansa, do Rio, de Niterói, de Bom Jardim de Minas...
Nos meus 40 não vou fazer festa! Tenho que juntar grana para realizar um daqueles sonhos lá... lá dos 12 anos... É muito importante nesses 40 fazer um retrospecto de que eu realizei muita coisa e da galera que adquiri nacional e internacionalmente (sem um puto no bolso). Não, meus amigos não cabem em uma só mão... e olha que a minha tolerância para as coisas que não acredito serem as certas diminui a cada dia... amo cada um desses meus amigos de perto e distantes!
A sorte sempre me ajudou quando eu "arregacei as mangas". Não nasci rica, mas para cada etapa realizada tive que "dar um passo para trás" antes. Então, acumulei cada experiência... já embrulhei velocípede com a Érica rindo da minha cara, já entreguei bujão de gás empurrando a Fiorino, já fui garçonete "dando uma canja" de vez em quando, estagiei em uma indústria de dinamite, já servi sorvete na Girafus... Depois da faculdade meu primeiro salário foi R$150,00 na Federação de Bandeirantes do Brasil... e daí, só com muita estafa e cachaça para as coisas darem certo! Um segredo também para sonhos se realizarem é saber desenhar, tocar violão e escrever.
Todo mundo sabe o que eu faço hoje: sou professora universitária. Esse acaso se deu mais tarde. Agora leciono porque em um daqueles banhos de rio noturnos, sonhei com o Bibo em trazer o Design para o interior. E por causa disso, hoje na Região muita gente fala em Design. Coordeno uma equipe de 15 designers e outros agregados. E, se eu souber que tem algum aluno não fazendo aquilo que eu, o Bibo e a Ana Paula acreditamos, vai ganhar um puxão de orelha... sou filha da Dona Uyara. Tenho um legado a deixar!
Esse post só acontece porque minha irmã pediu. E estou há um mês de ser a próxima na fila dos 40. O lado bom da vida em meio a essas dificuldades? Os amigos que fiz, sem dúvida! Não vai haver festa de 40 porque não caberia em nenhum lugar todos os meus amigos! Por isso decidi fazer a contagem regressiva na rede www. Mas venho ganhando presentes desde o nascimento do Yuri, da Mariana, do Arthur e da Julia... depois, Maria, Marina, João Pedro, Davi, Luiza(s), Bibi, Pedro, Helena, Bia, Francisco(s) etc etc... e é claro, depois de tantas vezes madrinha de casamento (uns 8 no total), 3 presentões: Kamea, Clarinha e Giovana, meus afilhados! E um que cresce em metros cúbicos: Erick! Sejam bem vindos todos esses presentinhos que estão chegando, pois sei que esse povinho dará uma bela continuidade naquilo que sonhamos juntos!
Fiquem despreocupados, meus amigos... essas crianças vão roubar carro, transar sem camisinha e fumar maconha, assim como vocês os fizeram. A vantagem é que, enquanto vocês estiverem dormindo, eu vou estar na balada de olho, enchendo alguns copos com cerveja e dando uns tapas nas orelhas se fizerem merda! Pode dormir sossegado, Matuzalém!
Hoje posso dizer que aos 40 sou realizada! Estou ao lado do grande amor da minha vida, papai está bem e Dany me proporciona grandes momentos em sua própria casa de praia.
Bora largar o rivotril, meu povo, e transar muito! Esse é o segredo de ver o lado bom das coisas! Tem um temperinho especial: saber falar palavrão e ligar um grande FODA-SE na hora certa! Funciona que é uma beleza!
E fecho com uma célebre frase: "Não quero morrer com a sensação de não ter vivido certas coisas!" (Malfacini, Ana Linspector)
Até dia 02 de Abril!